18 de mar. de 2011

Questão de Opinião: Pode um demônio ser bom?

Ou "Como Eddie Bloomberg nos ensinou o que é heroismo"

O que nos leva a sermos “bons”? Bons no sentido de “não sermos maus”.

Há com certeza diferentes respostas, motivos pessoais, religião, educação dos pais. Sim! Mas isso é uma coisa só. O fato de vivermos em sociedade – e cada vez a sociedade vem se tornando mais global – nos impõe que adotemos certas regras de conduta, certos comportamentos que fazem com que a vida nesta comunidade seja benéfica e útil a todos. Quem por ventura não se encaixa no padrão que a sociedade, o coletivo vai definindo, é por que acaba quebrando tais regras: inclui-se aí toda a espécie de roubos, de homicídios, de discriminação, de quebra de valores. Esses valores constituem o que há séculos os filósofos, os religiosos e toda a sorte de “reles mortais” conhecem – e discutem sobre – como moralidade.

O que é ser moral? O que é ser imoral? O que é ser amoral? Depende.

Na verdade, o que é importante aqui é o que a moralidade representa em termos de classificação dos que vivem em sociedade: somos bons ou somos maus!

Esse é o ponto chave da vida em sociedade, sermos morais, ou seja, bons. Se vivermos bem em sociedade, somos morais. Não cabe aqui julgar se os valores morais que hoje nos são impostos condizem com a atual situação da sociedade e se convém que sejam muitos dos mesmo que de séculos atrás. O fato é que há uma moralidade estabelecida, que para ser cumprida hoje em dia estão documentadas em leis. Mas o conjunto destas normas morais forma um código maior e mais pessoal: um código de ética. A ética é o conjunto dessas moralidades. Ser ético é ser mais que moral: é não só ser bom, como é ser justo.

Desde a criação de Superman, o avô dos super-heróis, esse é o tema dos quadrinhos de super-heróis. A luta entre o bem e o mal, a busca da moralidade, do bem maior para a humanidade, da verdade e da justiça. Ser um herói é ser bom. Os heróis lutam contra o que é mau e o que vai contra a moralidade.

Mas como pode alguém com tantos poderes usá-los só pelo bem alheio? Que tipo de bondade e moralidade é essa? O Super-herói não é só bom, ele é altruísta, ele ama os demais. Mas será só isso? Será que na vida heroica de Superman, o que ele faz é só por pura bondade ou é essa a forma que ele tem de se sentir aceito, ou no conceito mais primitivo, humano? E se for por ser aceito, ele continua sendo altruísta ou não é nada mais do que egoísta? Ele salva a todos, inclusive vilões, porque ele é bom ou porque é o aceitável, o moral, o ético a fazer?

Vejamos o caso de Bruce Wayne, que teve os pais assassinados. Ele é um herói por que quis acabar com vilões que podem deixar crianças órfãs? Ou porque na época ele era incapaz de fazer algo para defender seus pais e quer suprir a culpa agora? É vingança? É moralidade? Mesmo que seja, será que todo mundo acha que o Batman é bom? É justo? É ético?

Será que esses adjetivos não se desencontram às vezes? Ser ético é ser bom, é ser justo, é ser moral, é ser heroico? Sempre?

E então chegamos aos Titãs. Mas para elucidar esse tema não vou falar de equipes, de medalhões titânicos, ou de personagens atuais, não quero tampouco falar sobre o quanto cada um é heroico. Quero tratar de um querido personagem: Eddie Bloomberg, o Demônio Vermelho!

Eddie era um garoto comum que vivia com sua tia Marla em meio ao mundo do cinema e das “celebridades”, que adorava quadrinhos e coisas que hoje chamam de cultura pop, e que sonhava em ser parceiro de seu herói favorito, o Demônio Azul. Eddie ansiava pelo carinho e aprovação de Dan, o Demônio Azul. Apenas ele e sua tia eram o que Eddie podia chamar de família. E após um tempo, Dan foi só o que restou, já que Marla morreu. Mas Dan teve um involuntário envolvimento na morte dela, e por isso não atentou mais à Eddie.
Eddie, na ânsia de ser aceito, criou um uniforme de Kid Demônio para ajudar seu ídolo. Eddie procurou ajuda do projeto de Luthor, o Everyman para ser um herói, mas não foi aceito. Eddie fez então algo desesperado para realizar seu sonho de ser um herói: com a ajuda de seu único amigo na época, Zachary Zatara, foi ao inferno e aceitou uma eternidade de escravidão em troca de uma curta existência terrena com poderes que o tornariam um herói como seu ídolo ao fazer um pacto com o demônio Neron.

Resultado? Sua relação com Dan não melhorou, já que ele descobriu que por Dan ter feito o mesmo tipo de pacto com Neron, sua tia havia morrido. Com isso sua confiança em Dan foi abalada, exatamente o quebraria o pacto e daria direito a Neron de levar a alma de Eddie ao inferno com 21 anos de idade, como escravo.

Eddie foi altruísta? Ele tinha desejos morais de se tornar herói? Ele foi ético ao se vender ao inferno por poderes? Talvez, ou provavelmente, não! Eddie quis poder estar ao lado da única figura paterna que ele tinha. Ele quis ser visto e valorizado. E para isso ele usou de recursos que se quer passariam pela cabeça da maioria das pessoas aceitar.

Mas Eddie teve a felicidade de estar entre os Titãs. Lá ele pode usar os seus poderes para ajudar os demais. E que melhores exemplos ele poderia ter ao seu lado? A filha de um mercenário de aluguel que foi, durante muito tempo, sua melhor amiga e, talvez, amor; uma alienígena de uma raça nada “boa” que escolheu o caminho da moralidade humana; uma garota perturbada pelas suas perdas, com um pacto semelhante ao seu com o deus da guerra; e um jovem que perdeu seu pai por querer ser um herói. Eddie estava aprendendo a fazer o bem, a ser um herói, mesmo entre tropeços, burradas e pela busca por aceitação dos demais. E ele conseguia se ver como um igual a todos aqueles que estavam com ele, aos seus colegas Titãs. Até que sua antítese apareceu: Jaime Reyes, o Besouro Azul III. Jaime e Eddie eram opostos. O yin e o yang. O Azul e o Vermelho.

Em Jaime, Eddie via todos os seus erros e tudo o que ele não gostava em si próprio. Jaime era fisicamente um humano, embora usasse uma armadura. Eddie era fisicamente um diabo. Jaime foi “escolhido” pelo escaravelho para ser um herói. Eddie desceu ao inferno para ter poderes e ser um. Jaime tinha família e amigos. Eddie mal conseguia se manter ao lado dos Titãs. Jaime tinha ajuda constante do escaravelho em suas costas. Eddie tinha a si próprio. Jaime chamou atenção de todos quando chegou. Eddie nem podia ser abraçado por ter a pele em brasa. Entre tantos outros pontos dissonantes.

Mas ambos passaram por cima disso tudo e se tornaram amigos. E Eddie foi se tornando um Titã heroico e valoroso, resistindo bravamente com Jaime, dando suporte a Cassie, enquanto a equipe ia se desmantelando aos poucos. Eddie, embora por caminhos tortuosos, foi se tornando bom.

Até o dia em que perdeu seus poderes por ser mordido pelo Irmão Sangue. Eddie era novamente apenas humano e se sentiu um incapaz por isso.

Eddie não se via mais como parte da equipe, ele não podia mais oferecer muito além de suporte. E foi assim que ele se foi...

Enquanto os demais, incluindo a não Titã Traci 13, resgatavam a Moça Maravilha, Eddie precisou usar toda sua falta de poderes para tirar um preso de Alcatraz que, por causa do Quinteto Mortal, tinha se tornado radioativamente instável e estava para explodir, podendo matar inúmeras pessoas. Enganado pelo Calculador, Eddie foi atrás da bomba-humana e a levou para longe, para o alto, onde ela poderia explodir com um número muito baixo de vítimas: ele próprio. Eddie sucumbiu deixando claro que era um Titã completo, entoando o mantra de todos que foram Titãs: Titãs Unidos!

Eddie morreu como um legítimo herói, dando sua vida em troca da dos demais. Eddie entendeu o que profundamente era ser um Titã. Mais do que ter poderes, ser um herói era escolha sua, ser bom e fazer o que era melhor para todos, sem ser “super”, dando sua vida em sacrifício. Ele não só salvou os seus amigos, como salvou a cidade, os vilões e ensinou a quem mais precisava, que o mundo precisa dos Titãs: a Moça Maravilha. E com isso ela pode tirar o mundo que carregava nas costas e conduzir sua equipe para o destino de heroísmo para o qual nasceu.

Mas, ao final de tudo isso, ficam algumas perguntas: Eddie era ético e moral? Muitos talvez digam que não, já que ele fez um pacto com o demônio. Ele era a síntese da questão universalmente discutida “os fins justificam os meios?”. Ainda assim, mesmo que não fosse totalmente moral, Eddie era, por isso, mau? Nunca! Podia um Demônio ser bom? Poucas vezes os Novos Titãs encontraram alguém com um coração tão bom e que tivesse feito tanto bem aos demais. Então ele foi um herói? Sim. Mas ele foi mais heroico enquanto tinha poderes ou enquanto humano? Bem, aí já é questão de opinião.

O certo é que o que é moral, justo, bom, ético ou heroico tem sido tema de discussões e devaneios ao longo do desenvolvimento do pensamento humano, e será ainda por gerações, tanto mais quanto mais a humanidade “evoluir” e mudar. Entretanto, se querem saber o que eu tenho a dizer sobre Eddie Bloomberg, o anjo conhecido como Demônio Vermelho, é, independente de tudo, que ele é meu bom herói!

5 comentários:

Jasanf disse...

Querido blogueiro, há um presentinho para ti em meu blog Lectando-me. Com carinho, ofereço-te.
Abraço,
Jasanf.

Nícolas disse...

Nhé!
Nunca curti muito o Demônio Vermelho nem o Azul, mas curti o "retoque" que o Vermelho deu nos Titãs...

Gustavo N. Rocha Dias disse...

A palavra demôno vem do grego daemon, que significa espiritos/seres não que sejam bons ou ruins, apenas criaturas sobrenaturais, então sim, sem a influência/mão de uma sociedade, igreja ou cultura que deturpou o sentido da palavra...enfim, sim pode ser bom tanto quanto pode ser ruim.

Anderson ANDF disse...

Interessante... Bem, existem outros exemplos, de outras editoras, que muita gente sabe:
SPAWN (Image)- era um agente especial assassino que fez um pacto pra voltar imortal e poderoso em nome da esposa.

HELLBOY (Dark Horse)- um demônio "filhote" secular, que foi adotado por um pesquisador e é membro fundador de uma agência especial caçadora de monstros e que lida com forças sobrenaturais.

DEMOLIDOR (Marvel)- filho de um boxista e de uma freira, estudante exemplar, sofreu um acidente que o cegou e desenvolveu seus demais sentidos. Decidiu aprender a lutar pra se defender e mais tarde (após o assassinato do pai), se tornar um vigilante "fantasiado" de demônio.

Esqueci de mais alguém? ;)

Rodrigo Broilo disse...

Valeu Gustavo pela explicação! Essa eu não sabia!